MARIA JOSÉ DE ALMEIDA ELIAS

Maria José de Almeida Elias
Maria José aos 2 anos de idade - 1923

Minha mãe Maria José nasceu em 1921 em Pedra Azul, Minas Gerais, onde fez seus estudos primários. A seguir cursou o Colégio S. José, internato dirigido por freiras franciscanas, em Salvador, Bahia. Em Niterói fez o curso Normal - já casada, tendo quatro filhos e cuidando da mãe idosa que veio residir conosco. As demandas da vida doméstica e das atividades na igreja não permitiram que realizasse o sonho de estudar jornalismo.

Maria José participou, com meu pai Antonio Elias ou sozinha, de vários congressos e trabalhos evangelísticos e de consagração do povo de Deus. É autora dos livros: "O Teu Deus, Onde Está?" (1975); "Água Feita Vinho" (1977); "Cantigas para o meu Deus" (1985); "Era sem forma e vazia" (1987); "Família em foco" (1989); "Pescadores de Homens" com o Pr Odélio Hertz (1995); "Sucata de Lembranças" (1997); "Propostas Bíblicas para a Liderança Cristã" (1999); "Cartas de Amor" (1999); "A Família do Pastor e a Igreja" (2001); "Passos pelo Caminho" (2006); "O Deus Presente" (2007); e "A Oração na Bíblia" (2009).

Maria José e Antônio Elias

Em 1946 Maria José, católica praticante e convicta (liderava a 'Pia União' das filhas de Maria em sua cidade natal), conheceu Antonio Elias, missionário protestante, cuja tarefa era implantar a Igreja Presbiteriana no norte de Minas Gerais, começando por Teófilo Otoni. Conheceram-se nesta cidade.

Nas palavras dele (E as barreiras caíram!....no livro "Cartas de Amor", correspondência trocada pelo casal, publicada ao completarem Bodas de Ouro):

Fomos apresentados por um parente próximo, que morava com sua esposa, no mesmo hotel que eu [...] Poucas vezes tivemos oportunidade de trocar algumas palavras (geralmente quando eu chegava para as refeições e a encontrava lendo, na salinha do hotel). Falávamos sobre livros. Nenhuma ideia de namoro.

Ela se interessou por um livro que lhe disse que acabara de ler e que desejava emprestar-lhe. Tomei seu endereço e mandei-lhe o livro "O Manto de Cristo", de Lloyd-Douglas. Isso deu início à nossa correspondência, bem formal.

Sem encontros (era difícil viajar naquela época: havia ali somente a 'provisória' da Rio-Bahia. Não havia linha de ônibus, e o dinheiro era curto para a viagem no aviãozinho da OMTA - Organização Mineira de Transportes Aéreos); sem telefone, sem nos conhecermos melhor; contudo fomos descobrindo, por meio das cartas, um ponto em comum: o sincero e profundo amor a Jesus! O mesmo alvo. O mesmo objetivo que nos empolgava a alma.

Mas estávamos 'separados por igrejas'! Era um contexto de sérias barreiras e profundo preconceito religioso. Só quem viveu naquele tempo, em certas regiões de nossa terra, pode entender o que era isso! O Senhor, porém, foi iluminando o caminho e removendo as barreiras! [...].

Prossigo citando, agora, as palavras dela (Encontrei-me com Cristo!. "Cartas de Amor" ):

...Não raras vezes experimentei um desejo ardente de ter parte mais ativa no trabalho do Senhor. Levava, porém, uma vida cristã deficiente. ...Vida cristã! Mas vida cristã sem Cristo? Sem a Sua Palavra a animar-nos, a guiar-nos, a repreender-nos quando necessário? Não, não era possível!

Maria José procurou dois sacerdotes católicos romanos, expondo seu desejo de fazer um estudo sincero da Bíblia, invocando com humildade o Espírito Santo, a fim de que ele dissipasse as minhas [suas] dúvidas. Como resposta ouviu que tal estudo seria perigoso porque 'o Espírito Santo não inspira uma pessoa isoladamente', e foi aconselhada a ler um livro de meditações sobre a vida dos santos.

Prossigo seu relato:

Só Deus poderia socorrer-me! Jamais deixara de invocá-lo. E agora o desespero forçava-me a um mais completo abandono em seus braços de Pai amantíssimo! Foi então que se deu o grande encontro!

Em Belo Horizonte, numa reunião na Segunda Igreja Presbiteriana (convidada pelo até então amigo Antonio Elias), ao ouvir uma ardente invocação ao Espírito Santo, abri o coração, mendigando um pouco de luz que aclarasse aquelas trevas densas aliviando minha alma torturada! A resposta não se fez esperar: senti como que uma nuvem, um orvalho divino a refrigerar meu coração sedento. [...] Creio que palavras não descrevem esse encontro da alma com Cristo!

...Esse acontecimento, se não solucionou de vez todos os meus problemas espirituais, deitou por terra as barreiras que em torno de mim erguera o preconceito. E, abrindo de par em par as janelas do entendimento, deixou que a luz penetrasse em abundância, para que um livre exame da Bíblia, feito com humildade e confiança em Deus, mostrasse o caminho a seguir.

[...] Decidi-me, finalmente, pelo evangelho, não sem pensar nas lutas e provações que enfrentaria por isso. Elas vieram, como esperava: incompreensões, palavras amargas, lágrimas de entes queridos. Eu via tudo e não era insensível. Mas, ouvia também, a cada momento, a voz do Mestre a dizer-me: 'Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não a dou como o mundo a dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize!' (Jo. 14.27).

Casaram-se no ano seguinte, em 27 de janeiro de 1949. Tiveram quatro filhos (Lucio Antônio, engenheiro mecânico, Lucília, psicóloga, Paulo César, empresário e Teo, engenheiro mecânico ) - atualmente pastor titular da Igreja Presbiteriana Betânia -, quatro netos (Maria Elisa, João Antônio, Lila, Antônio, Fernanda e Nathália) e, por enquanto, um bisneto (Guilherme).

Retomo o relato de Antonio Elias:

E minha esposa, que foi batizada por mim e começou sua carreira de crente como esposa de pastor, quando dava os seus primeiros passos nesse caminho, já se atirava, com intenso júbilo, zelo e entusiasmo nas atividades da igreja. Cuidando do lar com extrema dedicação, porém achando sempre tempo e espaço para os compromissos da igreja.

Maria José de Almeida Elias foi para os braços do Pai amantíssimo (como se referiu a Deus em seu testemunho) no dia 18 de outubro de 2010. Na cerimônia de despedida, na Igreja Betânia, nos comoveu o modo como foi lembrada (destaco a revelação de alguns gestos de cuidado, até aquele momento anônimos, dedicado regularmente a pessoas necessitadas). Das homenagens escritas nessa ocasião, todas tão tocantes, transcrevo integralmente o texto do meu irmão Teo, biografia afetiva e precisa publicada no boletim da Igreja Presbiteriana Betânia no dia 24 de outubro de 2010:

D. MARIA JOSÉ E SEUS QUATRO GRANDES AMORES

20/10/2010 Teófanes Elias

Eu poderia destacar muitas coisas que me ficam bem vivas na lembrança da convivência de filho, incluindo as deliciosas tortas de banana e os não menos saborosos sorvetes de manga de seu próprio quintal, passando pelos doces e geleias de goiaba também do quintal de casa, tudo feito e servido por ela com indisfarçável orgulho e prazer. Mas prefiro destacar seus quatro grandes e evidentes amores.

Amor a Deus

Minha mãe, D. Maria José Elias, amou com todas as suas forças o seu precioso Senhor e com Ele a Sua santa Palavra que ditou os rumos e a dinâmica de toda a sua vida e lhe inspirou os muitos livros e mensagens que produziu. Sua Bíblia exaustivamente estudada e marcada, suas mensagens, livros, aulas e textos sempre revelaram este seu grande e primeiro amor. Ela viveu plenamente a oração do Salmo 27:4 e 119:97.

Amor à Família

Maria José com a família

D. Maria José também amou muitíssimo ao seu esposo Antônio Elias e à família que constituiu com ele. Os muitos e inesquecíveis encontros de família nos almoços por qualquer razão, nas celebrações de Natal e onde quer que ela pudesse ajuntar a família, nunca poderiam acabar sem muitas fotos que ela insistia em tirar (frequentemente contra a vontade da maioria) para marcar a bênção do amor da família e pela família que tanto ela cultivou. Para ela, cumprir I Timóteo 5:8 sempre foi puro e espontâneo prazer.

Amor à Igreja

Mas também para a mãe, a igreja foi um de seus maiores e mais ardentes amores. Revezando-se como presidente da sociedade de senhoras, ou como professora das classes de panorama bíblico, orientando os jovens na caravana missionária à Aracaju, pregando mensagens em muitos diferentes auditórios pelo Brasil, enfim, pastoreando os rebanhos que o Senhor lhe apresentava, tudo o que tivesse relação com a igreja para ela era coisa cara e preciosa merecendo a maior parte de seu tempo e de seu trabalho. Nunca admitia que se falasse mal da igreja ou de seus pastores e sua agenda vivia lotada de compromissos com a(s) igreja(s), o que lhe foi grande bênção, mantendo-a ativa e feliz até o fm. No meio das muitas dificuldades e lutas típicas do ministério, da igreja também recebeu ela muito amor que tanto nutriu sua vida. Ela bem cumpriu e provou da verdade de 1 Co. 15:58.

Amor ao Próximo

Mamãe também soube amar a seu próximo, aqueles de fora da igreja que Deus colocava em seu caminho, e isto ela fez praticando muitas boas e secretas obras, incluindo as "adoções" de filhos que moraram em nossa casa por muito tempo, todos precisando de recuperação e amor que lhes havia faltado pela vida. Isto sem esquecer dos que à porta de casa batiam com grande regularidade pedindo alguma coisa, alguns representando estranhas organizações de caridade às quais ela insistia em ajudar, mesmo duvidando de sua procedência. Ela não conseguia despedir no vazio alguém que se aproximasse buscando ajuda, ainda que muitas vezes tivesse se arriscado bastante com aquelas aproximações de caridade e sensibilidade com o próximo sofrido. Ela praticava Provérbios 3:27 e 28. O jovem paulista viciado em drogas que veio para Niterói em busca de recuperação no S-8, mãe e filha portuguesas que encontraram a Betânia dos primeiros tempos e não tinham onde morar, o sobrinho mineiro e desempregado, a colega de escola da filha, foram alguns dos muitos que moraram lá por casa por iniciativa de mamãe e por longas temporadas dividiram o espaço, o tempo e os demais recursos da casa com os seus filhos e seu esposo. Foi por estas e outras que meu irmão Cecé disse que mamãe teve mais filhos do que papai. Sei que com ela cumpre-se agora a profecia de Daniel 12:3: "Os que forem sábios, pois, resplandecerão, como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas sempre e eternamente."

A doída saudade que sinto de D. Maria José Elias acompanha uma grande gratidão a Deus pelo privilégio de ter-me feito seu filho e beneficiar-me tanto da sentença de Provérbios 14:26.

27/03/2025 Lucilia de Almeida Elias Lopes

D. MARIA JOSÉ

"UMA MÃE INTERCESSORA NO BRASIL"

Foi sepultada em Niterói, RJ, no dia 19. 10.2010, às 16h, D. Maria José ou "a mãe", como a chamávamos carinhosamente. Mais de 58 anos de casada com Rev. Antonio Elias, falecido em 2007. Um casal que marcou gerações. Desde 1983, o Pr. Antônio Elias e D. Maria José tornaram-se amigos da Oitava Igreja Presbiteriana de Belo Horizonte. Eles nos ajudaram a construir uma caminhada de fé e deixaram um legado inspirador através do seu exemplo de vida, seus conselhos, seu bom humor, seu amor pela oração, sua busca pelo poder do Espírito Santo, sua paixão pela igreja e pela salvação de almas.

De D. Maria José ficam várias impressões em meu coração:

  • Humildade e bondade. Nunca ouvi D. Maria José dizer uma palavra contra qualquer pessoa que tenha ferido seu marido e ou seus filhos. E olha que não foram poucos. Tudo era colocado nas mãos de Jesus, que é quem dirige tudo.
  • Vida de oração. Perdi e perdemos (seus filhos de sangue, noras, genro e netos e nós, seus filhos adotados, e dezenas de igrejas) uma intercessora exponencial. O dia começava e terminava com oração.
  • Mulher sensível. Flores, pássaros, riachos, borboletas... Detalhes pequenos não escapavam aos olhos e observações desta mineira poetisa, nascida no Vale do Jequitinhonha, MG.
  • Escritora. Seus livros, em linguagem simples, comunicam verdades profundas do Evangelho.
  • Hospitaleira. Sempre alegre para receber quem chegava a seu lar. Por várias vezes tive o privilégio de ser recebido na casa de D. Maria José, quando casado com Ana Maria (faleceu no ano 2000) e depois com Claudia Maria. Seus conselhos e exemplos foram de alto impacto em nossos corações. Sempre um café quentinho, uma mesa farta, uma prosa inspiradora, uma oração que empurrava a gente pra frente e uma risada livre.
  • Amor pela família. Educadora paciente e firme. Quando vinha a BH sempre tirava um tempinho para ir ver os parentes.
  • Pregadora piedosa. Seus estudos bíblicos sempre foram bálsamo para os nossos corações. Sua voz tranquila, bondosa e mansa transmitia palavras de fé, e consolo.
  • Coração generoso. Uma das marcas dessa generosidade era o doce de manga em compota. No quintal da sua casa há um frondoso pé de manga. Em toda safra de mangas, ela pessoalmente fazia doce em compota. Dezenas de vidros. Estes eram vendidos para ajudar pobres e missionários. Um dos privilégios que perdi com o seu falecimento é que nunca mais terei meu doce de manga. Por vezes, ela guardava, por dias e meses, meu pote de doce. Ou trazia quando vinha a BH, ou me entregava quando ia visitá-los em Niterói.

Descansou no Senhor. Sua partida se deu ao lado de sua filha Lucília, após anos lutando contra um câncer. Com o falecimento de D. Maria José, perdemos mais uma daquelas colunas da Igreja Evangélica Brasileira, que inspirava nossas vidas pela piedade, simplicidade, fé e amor por Cristo. O Senhor que nos consola é também aquele que mantém a Igreja e nossas vidas frutificando como fez com o Pr. Antônio Elias e a D. Maria José Elias. A Ele toda glória e gratidão.

Outubro de 2010 Pr. Jeremias Pereira